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Segurança nas escolas passa pela integração entre autoridades e comunidade escolar

A fim de discutir um assunto pertinente para os tempos atuais e que, de um modo ou outro, afeta toda a sociedade, a Comunicação da Teorema Sistemas realizou uma entrevista com o Capitão João Rodrigues Feitosa, que é capitão aposentado da Polícia Militar, ex-integrante das Rondas Ostensivas de Natureza Especial (Rone); do Centro de Operações Oficiais (COE) e da Inteligência da PM. Ele é formado pela Academia Policial do Guatupê; Curso de Operações Especiais PMPR; Response to active shooter incident, do Departamento de Estado dos Estados Unidos (EUA) e Active shooter incident – ALERRT (Advanced Law Enforcement Rapid Response Training), também dos EUA.

 

Cap. João Feitosa: a responsabilidade é de todos nós

Diante dos últimos acontecimentos, quais são os principais desafios de segurança nas escolas brasileiras?

Para que possamos compreender os novos desafios na segurança das escolas brasileiras, principalmente aqueles advindos dos eventos recentes, é necessário lembrar que o ambiente escolar sempre foi, e sempre será, alvo de ameaças, tais como: o tráfico de drogas, o furto de equipamentos, a depredação do patrimônio, a ação de predadores sexuais, a violência, a introdução de objetos não autorizados como armas e material pornográfico, e os ataques (erroneamente chamados de massacres).

A maneira utilizada para prevenir esses riscos consiste em medidas de segurança simples, e que se tornam muito eficazes, mediante a interação dos diversos responsáveis pela segurança. Devemos compreender que todos nós somos responsáveis. A prática demonstra que as medidas tradicionais de segurança, aliadas à interação adequada das pessoas pertencentes à comunidade escolar são suficientes para evitar, e nos casos mais graves, para minimizar os danos. Portanto, a resposta é que o principal desafio de segurança nas escolas brasileiras é o de retomar o senso de responsabilidade e promover a interação dos: gestores, funcionários, professores, pais, alunos, autoridades e da comunidade em geral.

 

Nesse contexto, quais são as melhores práticas para aumentar a segurança nas escolas?

Devemos compreender que a segurança nas escolas começa em casa, passa pelo deslocamento do aluno até o estabelecimento, sua entrada, permanência, saída e retorno ao lar. Utilizar a faixa de pedestres; olhar para os dois lados antes de atravessar a rua; não falar com estranhos; utilizar a cadeirinha no carro; usar o cinto de segurança; fazer uso do uniforme… tudo isso faz parte da segurança nas escolas, portanto, depende de todos para ser realizada com êxito.

No ambiente escolar, pegando o gancho deixado pela resposta anterior, primordial é a retomada da interação adequada entre os responsáveis. Depois é a adoção, e manutenção, daquelas medidas consideradas básicas, como por exemplo: barreiras físicas no entorno da escola; monitoramento do ambiente, corredores, acessos, pátios; o controle dos pais daquilo que o aluno leva para a escola; o controle do acesso ao interior da escola; e a ronda policial. Com a adoção dessas medidas é criada uma rede de proteção do ambiente quase que intransponível.

Observa-se que o problema, normalmente, acontece quando essas medidas são negligenciadas, favorecendo a atuação de pessoas com intenções ruins, sejam elas alunos ou estranhos.

 

E qual o papel das autoridades públicas na segurança das escolas

Da mesma forma, devem, inicialmente, retomar a interação com a comunidade escolar, realizar roteiro de visitas, realizar rondas periódicas, promover treinamentos, realizar treinamentos para seus quadros, tudo no sentido de reaproximar-se da escola, e de manter-se presente. Tive a oportunidade de conversar com policiais do Texas (EUA) e notei que todos, sem exceção, tinham realizado treinamento com funcionários e professores, conheciam as escolas existentes em seus setores de patrulhamento, bem como traziam consigo um croqui das escolas que seria usado em emergências, para orientar equipes que viessem de outro setor. Introduzimos, com sucesso, essa prática quando atuamos como secretário municipal de segurança, conseguindo evitar um ataque que havia sido planejado para ocorrer em uma escola, no ano de 2019, aqui no Paraná. Na época um jovem foi preso e farto material foi apreendido, inclusive um revólver calibre 38. Cabe lembrar que na ação nenhum tiro foi disparado e nenhuma pessoa foi ferida.

 

Em sua opinião, como a tecnologia pode ser usada para melhorar a segurança nas escolas?

Creio que é uma ferramenta fundamental, com ela pode-se realizar o controle de acesso, o controle eletrônico do entorno das instalações físicas, o monitoramento do ambiente e do entorno, melhorar a comunicação entre os pais e a direção, trocar informações com as autoridades, acompanhar os anseios e interesses dos adolescentes, prevenir tendências e situações de risco, incentivar boas práticas, e outras de suma importância.

 

Também é importante pensar em como a segurança nas escolas pode ser mais bem integrada com outras políticas públicas, certo?

O Poder Público tem participação fundamental no sentido de integrar as políticas públicas já existentes, principalmente aquelas voltadas à: aquisição de equipamentos policiais, manutenção de viaturas, assessoria técnica de segurança para as escolas, treinamento de professores e funcionários, aquisição e distribuição de equipamentos de segurança eletrônica, contemplar o calendário escolar com ações voltadas à tolerância e o combate ao bullying, e a fiscalização das atividades com foco no resultado.

 

Quais são as principais dificuldades para implementar medidas de segurança nas escolas?

A principal dificuldade diz respeito à nossa cultura, não à implementação das medidas e dispositivos, mas à manutenção dos equipamentos, das boas práticas e a obediência aos protocolos. Quando um problema acontece faz-se imenso alarde, instalam-se dispositivos, conferem-se os existentes, mas a euforia dura pouco, pois passados alguns meses deixa-se tudo para lá e esquece-se do ocorrido.

Muito comum ver-se nas escolas brasileiras, principalmente em locais mais pacatos, a existência do dispositivo de segurança, mas esse encontra-se com defeito ou desabilitado. Uma vez cheguei em uma escola, havia uma eclusa (dispositivo com duas portas para a triagem de visitantes) uma das portas estava “escorada” com um vaso de plantas para permanecer aberta, e na outra porta a lingueta da fechadura eletrônica estava colada com fita adesiva, bastava empurrar que ela abria, a justificativa da funcionária, da diretora, dos professores e dos pais era de que nessas condições a porta facilitava o acesso deles quando necessário, que a cidade era pacata e que naquela escola nada iria acontecer. Comportamentos como esse, infelizmente, são muito comuns e acabam por facilitar o acesso de pessoas mal-intencionadas ao interior da escola.

Ressalte-se, no Brasil ninguém reclama de instalar dispositivo de segurança em escolas, o problema aparece quando da utilização, e da obediência aos protocolos, pois esses são facilmente abandonados pela rotina, em nome da praticidade. Essa é nossa maior dificuldade.

 

Para finalizar, quais são as principais perspectivas para a segurança nas escolas brasileiras nos próximos anos?

A perspectiva é otimista! Como comunidade escolar temos aprendido muito, hoje a velocidade da informação permite que uma experiência vivida por determinada escola possa ser compartilhada, em tempo real, com as demais, mesmo no local mais pacato se sabe o que aconteceu e como isso pode ser evitado, isso aos poucos, de maneira lenta, mas progressiva, vai causando uma mudança cultural. E isso reflete na correta adoção das medidas de segurança. O conhecimento acerca do fenômeno que envolve o ataque às escolas também tem ajudado na prevenção, embora isso seja pouquíssimo divulgado, felizmente, no Brasil hoje, já existem mais ataques evitados que consumados. Todas as ações de sucesso são resultado de medidas básicas de segurança, realizadas de forma integrada pela comunidade escolar e autoridades.

 

Imagem ilustrativa: Adobe.

 

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